Tuesday, August 23, 2022

O CURTA METRAGEM   "ILHA DAS FLORES" –  1                        

INTRODUÇÃO. 

   Minha primeira preocupação ao escrever uma resenha dessa natureza e magnitude, seria a de estabelecer o contexto histórico e social em que o evento veio à luz. Seria contraproducente e ingênuo não falarmos dele, o que significaria não darmos atenção ao efeito produzido pelo contexto social e até mesmo político, do fenômeno social, ou da representação da vida em sociedade. Para Howard Becker, logo no início de seu livro “FALANDO DA SOCIEDADE”, à pg. 17, “Uma representação da sociedade é algo que alguém nos conta sobre algum aspecto da vida social”, quer seja através de um livro, um grupo organizado de fotos, ou um documentário filmatográfico dessa natureza. Essa, parece ter sido originalmente a intenção dos produtores e do diretor do curta metragem. Representação que necessariamente evocaria a existência do contexto social em que foi utilizada e desenvolvida, razão pela qual seria impossível separarmos uma coisa da outra. Howard Becker nos alerta que “ Todas as representações servem como instrumentos pra resumir dados e ideias” (pg.83). O que pode significar também que elas servem como veículos poderosos de veiculação de conceitos ideológicos. Cabe aos analistas desse fenômeno, analisar o contexto em que o curta se projetou como realidade sociocultural, política e até mesmo geopoliticamente relacionada.

  O Brasil de 1989 nos revela e surpreende com muitas surpresas dentro de todos esses contextos. Aliás, foi nesse contexto que a produção foi realizada. “O produtor fornece o material em estado bruto (mas não tão bruto assim) engenhosamente escolhido e arranjado, sem dúvidas, mas depois disso cabe ao usuário construir a análise, com toda a sua parafernália.”(pg. 71) No entanto, cabe ao diretor revesti-lo com uma roupagem sociopolítica  e cultural, como observamos claramente no curta, cabendo a ele o privilégio de se utilizar das muitas dimensões a serem exploradas e das ideias a serem veiculadas. A dimensão a que nos referimos, ou a que faz alusão  o diretor, tem ressonância com o contexto em que se encontrava o Brasil nos anos 80, no final dessa década e através dos anos 90. Seria fácil observarmos, por exemplo, através de comentários feitos a respeito do curta, e por meio das imagens mostradas nele, que o filme “Ilha das Flores” reflete com evidência e clareza o contexto político-social do Brasil dos anos  80. Mas, afinal, que contexto foi esse?

   O BRASIL E AMÉRICA LATINA DOS ANOS 80 – MUDANÇAS EM SEUS LIMITES E FORA DELES.

  Os anos 80 foram compostos por drásticas mudanças no cenário político da América Latina de modo geral, onde uma onda de democratização efetuou uma mudança do poder político do governo militar para o civil. Sem dúvida, foram anos de profunda transição política. Quase todos os países foram “democratizados”  e a transferência constitucional do poder político tornou-se um lugar comum. Desde o início houve uma tendência marcada rumo à democratização, o que se efetivou através de eleições para presidentes e primeiros-ministros, realizadas notadamente em 1988 e 1989. Por exemplo, na Argentina e na Bolívia – que realizaram eleições presidenciais em 89 – tais eleições tomaram lugar pela primeira vez em 61 e 25 anos respectivamente, por meio da expiração de seus termos eletivos. No Paraguai, o regime de Stroessner, no poder  por cerca de 35 anos, foi deposto em fevereiro de 89 através de um golpe de estado, ao que se seguiram eleições presidenciais em maio do mesmo ano. Eleições no Panamá foram declaradas inválidas em maio de 89. Tais fatos indicaram que a América Latina como um todo estava em período de  transição democrática. Alguns países enfrentavam a deterioração da ordem pública devido ao terrorismo, aos problemas ligados aos cartéis das drogas e outros problemas sociais.  


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